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Sob a escuridão da alma


Ela bateu na minha porta e eu a deixei entrar, ela jogou-se no meu sofá sujo de molho de tomate, tirou um maço de cigarros Marlboro, acendeu-o e começou a fumar. Fazia três noites que ela havia terminado comigo, fazia três noites que uma luz se apagou em mim, fazia três noites que só chovia. Não falamos nada um pro outro, fui na cozinha e peguei duas cervejas que já estavam ali há um bom tempo. Sentei ao seu lado e começamos a beber. De repente, a luz se apagou. Era um apagão, desses comuns que ocorrem nesses longos e quentes de verão. Coloquei minha cerveja na mesinha de vidro suja na frente do sofá, me levantei e fui até a janela do apartamento. Ele não era um dos mais chiques da cidade nem nada, mas uma coisa ninguém podia negar, eu tinha uma bela vista. Estava chovendo e estava escuro, a única luz que tínhamos era a dos relâmpagos. Então, sob aquele breu, ela veio até mim e encostou sua cabeça em meu ombro e ficamos alguns minutos olhando pela janela. Então, ela pegou meu rosto e nos beijamos. Sua boca estava com gosto de cigarros, mas não importava. Então, ela me empurrou e começou a chorar. Continuamos no silêncio, ele era a única coisa que nos protegia de nós mesmos. Ela me deu sua mão, e pediu desculpas. Eu disse não, eu disse que não me perdoaria pelo que eu fiz com ela. Eu e ela cometemos erros, mas nós sabíamos que precisávamos um do outro. Ela jogou o cigarro pela janela, e com sua mão ainda na minha, me guiou para o quarto. Deitamos na cama e ficamos olhando para o teto sem dizer uma palavra.

Acordei no claro, a luz havia voltado, olhei pro lado e ela já não estava mais lá, em seu lugar, um pedido de desculpas para si mesma. Sentei na cama e comecei a olhar nossas fotos na cômoda. Tentei ligar para ela mas ela não atendia. Continuava a chover, e toda a escuridão do apagão da noite passada continuava maior que nossas almas, e enquanto os dias passavam, ninguém sabia mais o que dizer, nem mesmo o silêncio.

Autor: Luis Eduardo Araujo de Souza